Vereadoras com plataforma em prol dos direitos das mulheres puxam votos e ampliam as bancadas do PSOL nas capitais
AdicioAs vereadoras eleitas Fernanda Melchionna, Áurea Carolina, Marielle Franco e Sâmia Bomfim |
É mulher preta! É mulher preta!”, bradou em Belo Horizonte no domingo 2 o grupo de eleitores e apoiadores da cientista política Áurea Carolina, 32 anos, após a confirmação de sua eleição como vereadora pelo PSOL. Mulher, negra e feminista, Carolina foi a candidata mais votada na capital mineira, arregimentando 17.420 votos.
Carolina é uma das parlamentares eleitas na semana passada que defendeu na campanha a ideia de ampliar a representatividade feminina nas Câmaras Municipais, espaço tradicionalmente dominado por homens. Articuladora do movimento ‘Muitas pela cidade que queremos’, que organiza discussões e eventos culturais em Belo Horizonte, Carolina iniciou seu ativismo no hip-hop. Sua expressiva votação, a maior da cidade nos últimos 12 anos, foi uma surpresa. “Menina, estou atônita, acho que ainda não caiu a ficha”.
Na esteira da chamada primavera feminina e de discussões sobre a questão do assédio e da cultura do estupro, candidatas declaradamente feministas e com propostas focadas nos direitos das mulheres alavancaram votos para o PSOL em diversas cidades importantes, como as capitais Rio de Janeiro, São Paulo, Belém e Porto Alegre, além de cidades como Niterói (RJ) e Campinas (SP).
Os resultados são um alento diante de uma realidade alarmante. Atualmente, existem 7.782 mulheres vereadoras em todo o Brasil, contra 49.825 homens. Os dados são da Secretaria de Política para Mulheres, que perdeu o status de ministério no governo Michel Temer e foi absorvida pelo Ministério da Justiça. No âmbito federal, menos de 10% dos parlamentares são mulheres.
Esses números persistem apesar da obrigatoriedade de cada partido reservar uma cota mínima de 30% para candidatas. Na prática, verifica-se que muitas dessas candidaturas são de "laranjas". Outras tantas, legítimas, acabam recebendo menos recursos que as dos homens. “Os partidos são instituições machistas, patriarcais e racistas há muito anos. E esse poder não vai ser desmontado pela intenção dos homens, são as mulheres ocupando que vão mudar o jogo”, diz Carolina.
Marielle Franco, 37 anos, negra, nascida, criada e moradora do Complexo da Maré no Rio de Janeiro, concorda. “Ou a revolução será feminista, classista e com o debate da negritude, ou não será”, afirma. Ela conseguiu 46 mil eleitores, tornando-se a quinta vereadora carioca mais votada. Socióloga e ex-coordenadora da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a militante do PSOL defende a presença das mulheres nos espaços de decisão. “Não pode ter só homens brancos ricos, que nunca tiveram medo de saltar num ponto de ônibus escuro ou que nunca tenham sido assediados”.
Na capital paulista, a bancada feminina dobrou, passando de cinco para 11 mulheres eleitas em um universo de 55 parlamentares. Duas são declaradamente feministas: Juliana Cardoso (PT) e a estreante Sâmia Bomfim, 27 anos, primeira mulher vereadora do PSOL a ser eleita para a Câmara.
Formada em Letras pela USP e funcionária pública na mesma universidade, Sâmia voltou para a Câmara dos Vereadores, literalmente, pela porta da frente. Em junho, a feminista foi retirada à força do parlamento paulistano e arrastada por dois policiais militares durante um protesto contra sessão solene que comemorava a exclusão das discussões de gênero no plano municipal de educação. “A gente foi arrancada a força de lá e vamos entrar num novo patamar de disputa agora”, afirma. Sua prioridade no mandato será o enfrentamento da violência de gênero, defendendo a expansão das delegacias da mulher com funcionamento 24h.